“Até o instante da iluminação, achei que meu propósito aqui fosse proteger o mundo dos excessos da humanidade. Agora vejo que eram apenas os últimos vestígios do ego humano em busca de uma função. Ninguém tem autoridade moral; certo e errado variam constantemente conforme perspectivas. Todo ser na Terra tem capacidade de ferir ou curar… e agora que estive dentro de cada pele e olhei por cada olho, meus medos quanto ao futuro se desfizeram. Compartilho das esperanças e sonhos do mundo inteiro, assim como cada ser vivo ao meu redor. Por uma fração de segundo, todo corretor da Bolsa soube como é ser uma folha de grama, cada átomo soube como é ser um bebê com fome. Pela primeira vez em muitos anos, a Terra ficou imensa e todos entenderam cada consequência de cada atitude já tomada. É assim que o mundo será salvo.”
E chegamos à conclusão de mais uma série clássica da Vertigo. O Monstro do Pântano de Mark Millar e Phil Hester, concluído na edição #171, bem como este volume da publicação, descontinuado após essa conclusão. O Monstro do Pântano só voltaria a ser publicado no ano 2000, com numeração reiniciada e roteiros de Brian K. “Saga” Vaughan (Mas isso é papo para outro texto ;>).
A Palavra, um análogo do Espectro – Sendo o Espectro a ira de Deus e a Palavra a Voz de Deus, ainda mais poderoso que seu irmão – é invocado para enfrentar o multi-elemental Holland, que se tornou ainda mais poderoso, incorporando o Verde, o ar, as águas e a terra em sua essência, para impedi-lo de causar um cataclismo no planeta, reeescrevendo toda a biosfera e apagando a humanidade. Holland está cada vez menos em contato com sua parte humana à medida que foi crescendo em poder por agregar os parlamentos em sua própria forma elemental, restando apenas o parlamento do fogo para o controle de tudo.
Apesar do tom de desastre iminente, paira a sensação que uma frase pode resumir: “Tudo vai ficar bem no final.”. A frase define o tom do arco, bem como define o run de Millar: O escocês iniciou à quatro mãos com Grant Morrison, porém por um desentendimento entre os dois, Millar logo estava assumindo os roteiros sozinho. Sendo um novato no mainstream, esse início de run, publicado nesta coleção “Raízes do Mal”, foi um tanto confuso e truncado – Inclusive tenho alguns amigos que desistiram de acompanhar a coleção pelo caminho -, porém ali por perto da metade, tudo entrou nos trilhos e Millar entregou um final muito digno, belíssimo. Millar cria momentos tocantes sem pieguismo, encerrando arcos de certos personagens de formas que o leitor jamais poderia imaginar. Muitas boas surpresas e um punhado de cenas que aquecem o coração.
Como nem tudo são elogios, devo ressaltar um furinho: Apesar de todas essas revoluções no planeta e todos os parlamentos envolvidos, o Vermelho não foi mencionado, ainda mais depois da revolução que Delano causou no título do Homem Animal, inserindo o Vermelho na mitologia da DC. Em um universo compartilhado, essa foi a pisada de bola de Millar. Holland trafega por todos os parlamentos elementais, porém o Vermelho foi ignorado. Mas ainda assim isso não comprometeu a conclusão da história conduzida por Millar. Realmente deu tudo certo no final. Faltam adjetivos para descrever a beleza de certas cenas, só mesmo lendo. Ó Millar, por quê paraste de escrever assim???
Millar usa um recurso que requentou anos depois: Sobre um ser acabar se tornando tão poderoso que acaba desenvolvendo uma espécie de consciência superior. Ele voltaria a usar esta cartada em The Authority, no arco “Terra Infernal”, mas de uma forma um pouco diferente, então OK. Apenas comentando que notei alguém se auto plagiando-se a si mesmo de leve hehehe. Segue o baile.
Ah, e participação especial de John Constantine, como não poderia deixar de ser! A criação de Constantine foi dentro das páginas de Monstro do Pântano, no run de Alan Moore, por isso, nada mais justo que o patife desse as caras nesse encerramento de volume. E que bela participação! Podem falar o que quiser do Millar, mas coloquem ele no lado certo da lista: Daqueles roteiristas que SABEM escrever John Constantine: As bravatas e blefes que saem da boca do mago, a magia, sutil mas sempre atuante, as tentativas de se dar bem e as trambicagens em vários níveis, trapaceando a todos. Ah, e como não pode deixar de ser, o indefectível cigarro é atrelado a um momento chave da trama. Um show à parte. Bravo, Mr. Millar!
Assim como a conclusão de Jamie Delano para Homem-Animal, onde uma utopia era instaurada, o que tornou quaisquer conflitos futuros no universo DC obsoletos, e portanto, foi desconsiderado na cronologia antes mesmo de qualquer reboot, Millar também dá um desfecho “definitivo” para o monstro do Pântano e o restante do universo DC à sua maneira, conclusão arrebatadora e utópica como o final de Promethea, de Alan Moore, em um evento de iluminação coletiva que gostaria de sonhar um dia ser possível no mundo real..
Compila as edições #166 a #171 de Swamp Thing.
156 páginas. Capa cartonada. R$ 23,90.