Cidade Invisível e o rico folclore nacional.

Recém lançada na Netflix, Cidade Invisível se encontra em primeiro lugar dos mais assistidos, na versão brasileira do aplicativo, em seu fim de semana de estréia. E não é pra menos. Cidade Invisível traz um bom romance policial com o elemento fantástico totalmente baseado no folclore nacional e de maneira exemplar.

Baseada num roteiro de Raphael Draccon e Carolina Munhoz, a série conta a história de Eric (Marco Pigossi) um policial da DPMA (Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente) que perde sua esposa, Gabriela (Julia Konrad) num incêndio misterioso. Esse incêndio ocorre na Vila Toré, um recanto próximo a mata, onde há uma comunidade pesqueira. Intrigado com a falta de explicações para morte de sua esposa mesmo um mês após o ocorrido, Eric decide partir por conta própria atrás de explicações. Indo contra seus superiores e contando apenas com o suporte de Márcia (Áurea Maranhão), sua parceira na Delegacia, ele se aprofunda num mundo desconhecido e perigoso.

Que droga diferenciada é essa?

Ainda na Vila, os moradores são assediados por uma construtora que procura construir um eco resort na região, tomando a mata como parte do empreendimento e prometendo cuidar do local com o devido respeito, além de pagar uma indenização aos moradores. Para ganhar a confiança da Vila, João (Samuel de Assis) que é nascido e criado no local, serve de garoto propaganda para o projeto, inflado por convicções próprias. Como bons trabalhadores brasileiros, eles desconfiam desse interesse e criam, com razão, uma resistência a essa mudança, liderados principalmente por Francisco (José Dumont) que é pai de João, gerando um conflito familiar. Porém as coisas começam a piorar após o incêndio que causou a morte de Gabriela.

Todo esse processo em torno do avanço da construtora sobre a comunidade ribeirinha traz a série um teor de crítica muito pontual. Em tempos como esse, em que o meio ambiente está sob os cuidados de um explorador em pele de ministro, toda a oportunidade de crítica é válida. Muito antes do “passa a boiada” empresas como a da série já faziam o curral em áreas de proteção.

Cidade Invisível brinca com o imaginário pouco valorizado do nosso folclore com naturalidade e sem os clichês habituais que encontramos em obras desse tipo. Um dos maiores exemplos disso é ausência de nomes caricatos e trocadilhos infames para apresentar as entidades que habitam o Rio de Janeiro. Outro acerto é a forma como as entidades se encaixam na sociedade. Desde pessoas em estado de rua até seguranças de bar, qualquer um pode ser uma entidade escondida entre os mortais, numa pegada de sociedade paralela que lembra muito Fábulas (Vertigo).

Logo no primeiro episódio somos apresentados a figuras como o Boto e o Curupira, que são difíceis de imaginar num contexto desses a princípio, mas que a série não falha em apresentar. Nessa fila ainda temos um carismático Saci e uma Cuca que faz jus a sua lenda. Além disso temos uma ambientação na Lapa que deixa qualquer carioca com os olhos brilhando, afinal quem nunca foi num barzinho estilo o Cafofo? Aliás, um destaque para a versão Ave, Lúcifer (Mutantes) cantada no bar pela personagem Camila (Jessica Corés).

A dona do Cafofo Bar, Alessandra Negrini, cumprindo com maestria o papel de Inês. Tentem adivinhar quem ela é de fato.

Cidade Invisível vem com uma roupagem diferente e moderna, dando visibilidade merecida ao nosso folclore tão desprestigiado e foi um baita tiro certo da Netflix. Agora é aguardar e ver se teremos boas novas sobre esse título para o futuro, seja com uma continuação ou novas histórias, o que acho bem mais acertado, dentro desse cenário de fantasia urbana.

Carolina Munhóz e Raphael Draccon

Texto por @prodrigues27


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Pedro Rodrigues
Perdido na vida há trinta anos, sem vocação pra ser "cult" e fã dos escritores britânicos. Estuda tarô, cabala, hermetismo, magia do caos e teoria da Mãe Piruleta que traz seu amor em três dias em território nacional. Em meio a tudo isso descobriu seu animal de poder, uma lontra albina. Lendo de bula de remédio a Liber Null e Necronomicon, seu propósito com a escrita é esvaziar a mente e evitar com isso a perda do seu réu primário.

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