MIRACLEMAN – UM SONHO DE VOAR (LIVRO 1)

Eu não gostaria de começar esse texto falando das brigas judiciais em torno da publicação deste personagem, pois acho que o leitor maduro que conhece o personagem já está careca de saber dessa história, mas gostaria de contextualizar que o Marvelman, (antes de se tornar Miracleman) foi um personagem criado por Mick Anglo em 1953 e o que nós vamos ver aqui é a história de Miracleman da fase Moore que pela primeira vez a Panini trouxe em sua totalidade, mas também veremos parte da história antiga do personagem que muito influenciou nas histórias do Moore. Moore este que depois de mais uma das suas contendas contra as grandes editoras exigiu que seu nome fosse retirado da história, assim atribuindo o roteiro da trama a o pseudônimo “O Escritor Original”. Fica estranho ler uma trama na qual o roteirista tem o seu nome subtraído por questões particulares. Assim é Alan Moore, e suas tretas não são novidade para ninguém heheheh.

Essa primeira parte da resenha compreenderá as quatro primeiras edições que a Panini lançou chamada de Livro 1 – Um Sonho de Voar. A primeira edição inclusive conta com 3 capas variantes, sendo uma destas uma capa metalizada muito bonita.

FOTO 1: CAPAS VARIANTES DA EDIÇÃO 1

Importante dizer que o ritmo das histórias que vamos ver segue o costume inglês de 8 páginas por edição, diferente do costumeiro estadunidense que chega a 22 páginas por edição (em média), Enfim, são histórias de tiro curto que eram publicadas muitas das vezes dentro de antologias, como a Warrior. A 1º edição traz uma história escrita por Mick Anglo (O criador do personagem) e desenhos de Don Lawrence. Importante dizer que nesta época, Miracleman já era publicado na Warrior com textos do Moore, então o que nós vemos aqui é uma remontagem histórica que não respeita necessariamente a ordem de publicação, mas acaba por introduzir o personagem de modo que o novo leitor se situe quanto ao personagem. Nesta primeira história vemos a Família Miracleman (Miracleman, Jovem Miracleman e Kid Miracleman), em uma aventura envolvendo viagens no tempo e conquistadores temporais. Cara… Apesar de isso ser escrito pelo Mick Anglo, eu diria que é uma típica história de Alan Moore. Acho que Mick Anglo fez essa de propósito hein? rsrsrsrs. Nunca saberemos. Ao final dessa trama, há um importante gancho de interligação entre as histórias do passado e o início das histórias do Moore. Veja na página abaixo.

FOTO 2: CITAÇÃO EMBLEMÁTICA DE NIETZSCHE

Agora começamos a ler os escritos de início descompromissados de Moore nos quais o personagem parece não se lembrar que é o Miracleman devido a uma programação mental e ao final da trama profere a palavra-chave que o liberta. Isso é o que Alan Moore sempre faz com seus personagens: Ele inicia essa história de tal modo que ele possa desenvolver a trama sem que precise respeitar eventos passados. É o que eu chamo de Desconstrução à la Moore. Esse efeito é observado também em Monstro do Pântano – Lição de Anatomia (publicação mais recente em que o vi fazer isso). Mas essa desconstrução não é completa em apenas 2 histórias (contidas na 1º edição nacional), isso vai ser desenvolvido ao longo destas 4 primeiras edições (nacionais) que compreendem o Livro 1 que esta resenha aborda. A partir da edição 2 a coisa começa a complicar tanto no campo emocional, com a relação amorosa entre Miracleman, Mike Moran (o alter ego do herói) e sua esposa Liz. Aqui nesta edição temos um confronto de terror com Kid Miracleman, um personagem que virou um terrível vilão nesta revitalização. Temos também a introdução de Aza Chorn, um Ferreiro Cósmico que ajuda Miracleman em uma aventura temporal, descontextualizada dentro da trama. Tudo meio confuso nessa passagem da história, mas calma.

FOTO 3: KID MIRACLEMAN E AZA CHORN

Na 3ª edição temos o final do primeiro confronto entre Miracleman e Kid Miracleman de uma forma inesperada, e convenhamos, de sorte para o nosso herói, e a introdução do Sr. Cream, um assassino profissional contratado para matar Miracleman.

FOTO 4: SR. CREAM E SEUS DENTES DE SAFIRA

Nesta altura da história, Moore começa a dar um contexto mais realista ao que está acontecendo no universo do personagem, tecendo uma conspiração com o governo britânico, que certamente deixa a entender que o leitor ainda tem muito a compreender sobre o passado do personagem (mais desconstruções a caminho!). Temos uma história curta apresentando mais dos Ferreiros Cósmicos e suas responsabilidades como guardiões temporais. Essa história nos remete mais ao que Moore fazia na 2000 A.D. nos Choques Futuristas, mas sem o tom de comédia. Mas é tudo – propositalmente – confuso, pois como explicar tecnologias incompreensíveis para nós mortais do planeta terra? Neste momento da trama parece que Moore está tentando dar uma importância maior para estes seres e o que eles representam dentro do contexto de Miracleman, mas aqui ainda é tudo muito nebuloso para se perceber alguma nuance. Na última edição do Livro 1, temos revelações poderosas do passado de Miracleman que faz o leitor pensar: “Porra… Isso é Alan Moore!”. Sim, porque ele consegue desconstruir tudo o que foi o Marvelman (do Mick Anglo) e atualiza o personagem em um contexto mais contemporâneo. O personagem começa a ter reações mais realistas sobre o seu universo, é como se você descobrisse que tudo o que vivenciou não é real, e imagina o choque que isso deve proporcionar? Aqui são apresentados elementos de engenharia reversa em tecnologia alienígena e a origem real do personagem através de um programa de defesa governamental britânico. É… Este primeiro Livro tem essa premissa complexa, a desconstrução de Moore e inclusão do personagem em um contexto contemporâneo, sendo muito bem sucedido em transformar a família Miracleman em algo mais do que apenas a cópia britânica do Shazam. Isso é o que Moore sabe fazer de melhor: Ele limpou as bases do personagem e agora vai começar o desenvolvimento do zero, lançando as base para a sua fundação sólida na história. Eu diria que… a partir do livro 2 é que a história começa de fato. Não que este livro 1 não tivesse sua importância, pelo contrário, o livro 1 é impactante, revelador, mas a impressão que fica é que Moore enfim se soltou das correntes do passado do personagem e vai desenvolver o seu Miracleman!

Um Alan Davis em início de carreira começa a desenhar o personagem a partir da edição 2, dividindo a arte com Gary Leach. Ainda não temos um Alan Davis pleno. Sua arte parece limitada pelos quadrinhos pequenos que caracterizam essas edições curtas. Neste momento ele é dotado de um traço vacilante ainda em formação, prejudicado um pouco pela colorização inglesa que traz muitas sombras e excesso de cores escuras, o que dá um tom menos vibrante e mais mórbido às histórias.

FOTO 5: A ARTE DE ALAN DAVIS

Acho que o ponto baixo dessas edições ficam por conta da introdução confusa dos Ferreiros Cósmicos e das quebras que toda edição tem, trazendo antigas histórias do Marvelman (do Mick Anglo), que acabam destoando não só em termos de nível de roteiro, como disparidade literária no que tange a forma de escrita, o que é natural, tendo em conta a distância de décadas que separa as fases. Marvelman é inevitavelmente uma história da Era de Ouro que não se encaixa nos dias de hoje, e alguns leitores certamente se sentirão terrivelmente incomodados com o nível infantil das histórias. Mas devemos lembrar de contextualizar essas histórias, originárias da década de 50. Deve ter sido o máximo para leitores daquela época que tinham como referências Superman e Shazam, como heróis mais próximos dos poderes de Marvelman. A propósito, por conta do formato das publicações acredito que há um excesso de extras em todas as edições, e são extras que se repetem, como layout de páginas inacabadas, por exemplo, causando a impressão de que você pagou por 52 páginas e só leu umas 30 páginas. Isso é perceptível e frustrante para alguns leitores rigorosos como eu vim a me tornar. Até a resenha do livro 2.

Texto por Conde.

Editora Panini.
4 Edições lombada canoa. Papel Off-set
Preços de Capa: 1º Edição Capa Metalizada R$ 13,90 (68 Páginas), 2º, 3º e 4º Edição R$ 7,50 (52 Páginas)

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