Pricila Elspeth, nossa musa da Ficção Científica nacional.

“A vida e a morte podem coexistir, desde que possamos entender seus reais significados.” .

Ubirajara em Uma jornada Tupiniquim

Se você é mais ou menos como a gente aqui na redação, sempre curioso(a) e atrás de novidades que valham o seu tempo escasso aqui nesse planeta, fique sabendo que de vez em quando a gente aparece com sugestões muito bacanas aqui. E o leque se expande cada vez mais: A Zona Negativa tem sido muito feliz em conhecer e se cercar de ótimos autores(as) nacionais também! Depois do bate papo com o nosso queridão Jean Gabriel Álamo e da nossa live com o Raoni Holanda, temos a honra de apresentar pros leitores da Zona Negativa mais uma autora nacional: Pricila Elspeth.

Escritora de sci-fi e fantasia, Pricila tem alguns trabalhos lançados independentemente pela editora Immortal. A paulistana de 35 anos se define como afroindígena, feminista, não-binárie. Além da prosa, Pri é historiadora, blogueira e educadora infantil. Ela é fã de ficção científica e fantasia, e esses são os gêneros literários que mais ela mais aborda em suas obras. Pri começou a escrever para o público em um blog, onde transformava conceitos como privatização, globalização e outras mazelas sócio econômicas em contos de ficção científica para melhor explicar os conteúdos aos seus alunos do Ensino Médio. Em seguida ela migrou para o Wattpad, onde lançou Ascenção, um livro que rapidamente caiu na graça dos leitores. Posteriormente alguns trabalhos foram postados de forma gratuita no Wattpad e outros comercializados pela editora Medusa e pela Amazon/kindle. Atualmente Pri escreve também na plataforma Buenovela, onde lança trabalhos inéditos e exclusivos para a plataforma.

“Os soldados que retiraram as máscaras eram idênticos aos moradores do acampamento, inclusive… Eu. Não conseguia entender o que estava acontecendo.”

Meu nome é Malik

Criogenia, cibernética, viagens interestelares, alterações genéticas radicais… não existem limites para onde a engenhosidade narrativa de Pricila pode levar o leitor. A autora lança mão de ficção hard de forma muito cuidadosa e eficiente, sem deixar os conceitos vagos demais ou, por outro lado, exagerar nas explicações, o que poderia cansa o leitor e fazê-lo se desconectar da narrativa. Além disso o leitor vai notar também, após um contato inicial, que a prosa de Pri é carregada de críticas sociais, muito pontuais e bem colocadas, assim como é cuidadosa e necessária sua atenção à representatividade, o que coloca o futurismo de suas obras em uma posição de verossimilhança maior em relação a muitos clássicos, que tendem a ser datados nesse ângulo. Nas palavras da própria autora, “Decidi escrever para ler as histórias que sempre desejei, mas que nunca eram lançadas. E por conta da representatividade e das críticas sociais que carrego. Cada texto tem um propósito além do gênero ao qual está inserido, levando os leitores a sempre fazerem uma reflexão. Gosto muito de representar realidades e pessoas, mesmo que através de metáforas.“.

“Ela levantou-se e socou o ar demonstrando toda sua indignação. Estava presa numa nave com uma IA autoritária e não era boa o suficiente para driblar seus mecanismos de defesa.”

Caligem

“Sou o último de minha espécie. Vago pelo universo desfrutando de minha longevidade. Observo, pois, não possuo mais o sentido da audição. Durante minhas observações aprendi muito. Cada civilização que visitei me ensinou a viver e aproveitar a vida de maneiras distintas. No momento estou observando uma civilização curiosa. Não possui muitas diferenças das outras as quais vi, no entanto, me chamou atenção por um motivo… Estão morrendo mais rapidamente do que qualquer outra espécie no universo.”

Privatizações dos Bens Naturais

UM BATE BOLA COM PRI ELSPETH

Zona Negativa: O que te motivou a escrever? Você lembra do momento ou evento exato em que você decidiu deixar de ser apenas uma leitora para começar a contar suas próprias histórias?

Pricila Elspeth: Sim, lembro. Eu lia a coleção do Perry Rhodan incansavelmente porque tinha de devolver para a biblioteca. Depois comecei ler Asimov e Ursula Le Guin, e esses me animaram mais, me faziam sentir emoções fortes, pensar sobre vidas artificiais ou vida em planetas distantes e suas culturas. No entanto, ficava sempre incomodada porque minha realidade nunca era representada na ficção científica, a de ninguém que eu conhecia, e isso colocava a história num patamar profundo de ficção. Eu queria ler histórias as quais eu pudesse verdadeiramente me ver representada na minha frente, e então decidi escrever. No começo sem arriscar muito, seguindo algumas receitas, mas depois eu comecei a desenvolver minha marca, colocar pessoas reais nas histórias, como é o caso da Comandante Kerolyn em Caligem; Ela é minha amiga e realmente não possui o sentido da visão. E percebi que histórias assim, com pessoas reais, culturas reais, me agradavam mais. E o momento exato foi quando comecei escrever Crônicas de Gênesis, que apesar de manter cautela, coloquei muito do que eu queria ver nas histórias, ali.

ZN: E quais são suas influências? Pela intimidade com o negócio, como dá pra perceber em seus textos, parece que você é fã quase que exclusivamente de sci-fi desde criança hehehehe. Como se deu essa formação pela preferência?

PE: Eu gosto muito de Sci-fi, é o que mais consumo em todos os tipos de mídia, mas gosto muito de fantasia e terror moderado também. Eu lia muito a série do Perry Rhodan, como já citei, Asimov e Le Guin eram minhas preferências até o final da adolescência, depois eu conheci outros autores, como Douglas Adams e Huxley, e aí pirei. Comecei a assistir séries de Sci-fi também nessa época, e Star Trek me ganhou, acompanho todas. E é legal porque ao reler meus textos, percebo pitadas de todos esses nomes lá, é surreal. E essa apreciação se deu ainda na infância com livretos e desenhos sobre o espaço, e até os mais bizarros, como SilverHawks me guiaram para a ficção científica. 

ZN: O que você anda lendo/assistindo/ouvindo, em resumo, qual arte tem mantido aquele quentinho no seu coração e te motivado a também continuar produzindo? Alguma recomendação pros nossos leitores?

PE: Atualmente estou lendo Uma Estrela Vermelha, do Bogdanov, revendo Star Trek: The Next Generation, e ouvindo é melhor nem comentar porque minha playlist tem de tudo, desde MPB até Black Metal. A minha produção é muito guiada por vivências, então, às vezes vejo uma descoberta científica e extrapolo um conto a partir dela, ou alguém reclama sobre uma dificuldade e aí penso como a ficção científica poderia resolver ou ao menos explorar isso. Gosto de retratar realidades.E por incrível que pareça, as questões que Data e o Doctor de Star Trek levantam são um poço infinito de inspiração para mim. Explorar as facetas humanas me mantém ativa e com o coração quentinho. Recomendo muito uma antologia chamada Universo Desconstruído.

ZN: Você tem alguma dica para quem está começando a escrever Ficção Científica? O que evitar, algum fundamento que pode ajudar autores novatos a fazerem suas histórias funcionarem…

PE: A dica é: não pare no tempo. Estude técnicas de escrita, leia artigos científicos, procure informações. Quanto ao que evitar, acho que é muito particular, mas gosto de pensar que uma história boa é aquela que você conta para si mesmo. E é interessante que ela contribua de algum modo com a sociedade. Escrever sobre caçadores de aliens é legal e tal, mas se não tiver um questionamento que faça o leitor pensar sobre seu cotidiano, sobre seus arredores, fica artificial e logo é esquecida. Então, a grande dica é, coloque questões humanas difíceis de responder como base da sua história, questionamentos que deixam o leitor pensando um pouco mais. É isso.

ZN: Você acha que num futuro nem tão próximo assim, caso a humanidade tenha alcançado o grau de tecnologia e estruturação social que a ficção especula hoje em dia, ainda haverá algo parecido com Ficção Científica? O progresso nos faria bater em um muro ou sempre dá pra extrapolar a realidade, por mais complexa que ela venha a se tornar?

PE: A imaginação humana é infinita. E as histórias são escritas com as informações que temos e algumas vezes baseando-se em contextos históricos. Hoje é comum extrapolar a computação quântica, depois virá outra coisa, não creio que surgirá uma barreira diante da criatividade humana. No futuro talvez as questões de FC sejam diferentes, como: criar estrelas, parar a entropia, ou como sobreviver somente; mas dependemos de histórias, e creio que será assim para sempre.

ZN: E por fim…

PE: Escrever é contestar o mundo particular de outras pessoas ao mesmo tempo em que elas conhecem e contestam o seu. É uma troca de potências e de relações; ou seja, a base da vida. E ser escritora para mim é mais que viver mil vidas, é mais que realizar sonhos e mais que brincar de Deus… É se permitir ser humano. 

“Está triste?” Perguntou olhando-a pelo retrovisor.
“Não.”
“Tem certeza?”
“Sim. A vovó disse que quando ela fosse, eu ia ganhar três avozinhas.”
Cibele sorriu e encarou a estrada. Infelizmente não é bem assim.
“A vó disse que na velhice a gente colhe o que plantou na vida toda. O que eu posso plantar, mãe?”
“Você já planta as coisas mais belas que existem, minha filha.”
“Eu? Sério? O que é?”
“Amor e sonhos.” Cibele sorriu e através do espelho viu a filha repetir o gesto.”

Conto Ciclicidade, na antologia Mabon

A Zona Negativa gostaria de agradecer Pri pela cordialidade e amabilidade com que nos tratou durante as conversas para desenvolvermos essa matéria, e que venham muitos contos mais dessa artífice do fantástico!

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Eduardo Cruz
Eduardo Cruz é um dos Grandes Antigos da Zona Negativa, ou sejE, um dos membros fundadores, e decidiu criar o blog após uma experiência de quase-vida pela qual passou após se intoxicar com 72 tabletes de vitamina C. Depois disso, desenvolveu a capacidade de ficar até 30 segundos sem respirar debaixo d’água, mas não se gaba disso por aí.

Ele também tem uma superstição relacionada a copos de cerveja cheios e precisa esvaziá-los imediatamente, sofre de crises nervosas por causa da pilha de leitura que só vem aumentando e é um gamer extremamente fiel: Joga os mesmos games de Left For Dead e Call of Duty há quase 4 anos ininterruptos.

Eduardo Cruz vem em dois modos: Boladão de Amor® e Full Pistola®.

24 comentários em “Pricila Elspeth, nossa musa da Ficção Científica nacional.”

  1. Que entrevista massa, a Pri tem muita dedicação e isso é nítido lendo os trabalhos que faz. Parabéns a Zona Negativa, por contribuir para que os leitores conheçam um pouco mais sobre autores nacionais que estão batalhando no ramo.

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    • A Zona tem sido muito afortunada em conhecer esses talentos que por falta de espaço e/ou visibilidade ainda não chegaram ao conhecimento do grande público, mas aqui temos o maior prazer em divulgar esses trampos de muito valor. No que nos for possível, a boa literatura nacional e os guerreiros independentes têm seu lugar garantido aqui!

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  2. Nos conhecemos a pouco tempo, mas aprendi e estou aprendendo muito com a Pri, e achei o máximo essa entrevista, muito interessante! Parabéns para a Pri e a ZN. Já sou fã!!!

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  3. Adorei a entrevista e conhecer um pouco mais desse universo tão longe de mim, mas que me faz querer se aproximar por proporcionar uma visão diferente da realidade e ao mesmo tempo tão próxima.
    Parabéns, Pri e zona Negativa pela a entrevista.

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  4. Parabéns pela entrevista
    Pri tem uma oratória linda
    Ao escrever sempre consegue tocar o coração das pessoas com tamanha delicadeza.

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  5. Amei a entrevista!
    Amo a escrita da Pri, e o fato de sempre nos trazer uma reflexão, nos aproximar da realidade de alguém que pode estar ao nosso lado, e ensinar com suas narrativas! ❤️

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