Resenha Relâmpago: CAPITÃO STONE: O QUE ACONTECEU AO CAPITÃO STONE?

Liam Sharp é um artista britânico que fez sucesso trabalhando para a 2000 A.D., inclusive tendo brincado com o carro-chefe da publicação, o Juiz Dredd. Christina McCormack é sua esposa, co-criadora e co-roteirista desta história aqui. Capitão Stone, apesar de ser originalmente publicada em 2014 lá fora (2018 no Brasil), traz uma aura noventista para a HQ, uma época de experimentalismos na arte. Dá para aproximar a arte de Liam Sharp com o que Dave McKean e Bill Sienkiewicz trouxeram para o campo da 9ª arte, todos os conceitos experimentalistas possíveis, traçando paralelos com metáforas, caricaturismo e noções complexas de exposição artística dentro de conceitos modernistas. A forma como a arte de Liam Sharp é construída passa por colagem, informações sub-ocultadas e um pouco do exagerado porte físico dos personagens principais (a lá Simon Bisley ou um Rob Liefeld da era Image). Nesta HQ a arte passeia por toda essa miríade de conceitos e ainda consegue captar um pouco da beleza do super-herói clássico. Então pega todas essas informações que eu dei, referências, mistura num liquidificador e você tem a arte diversificada de Liam Sharp.

INFLUÊNCIA ARTISTICA: DAVE MCKEAN, BILL SIENKIEWICZ E SIMON BISLEY

Os textos são verborrágicos, mas do meu ponto de vista isso não é nenhum demérito. Às vezes você demora um pouco mais para virar a página – qual é o problema nisso? Pra mim: Nenhum. A trama passa por contextualizações de mídia, como não poderia deixar de ser. O mote da trama é sobre o sumiço de um super-herói, que antes desse súbito desaparecimento teve sua vida e identidade expostas. Mas contar isso não chega a ser spoiler nenhum, pois aqui não está o foco, mas é importante revelar isso para explicar a exploração midiática onde grande parte da verborragia (desnecessária) está inserida. Outra parte da história a ser destacada aborda confissões e conflitos mal resolvidos entre alguns personagens. Em dado momento estamos mergulhados em um drama de família, com muita mágoa e ressentimentos sendo expostos, ao passo que também há uma maturidade na resolução desses conflitos. Centrado numa investigação sobre o sumiço do personagem, a trama assume um viés detetivesco no melhor estilo Ed Brubaker de contar uma história, de forma lenta, modorrenta, mas que te deixa cada vez mais interessado para saber o que se passa e aonde aquilo irá levar. A trama ganha alguns contornos de terror quando uma das personagens assume uma personalidade selvagem, animalesca, aqui você vê como a arte casa bem com o momento. Esta personagem tem um destaque de protagonismo em todo o volume. Mas o que me deixou mais empolgado foi o ‘final’ desta história, que é quando temos uma guinada surpreendente e a HQ passa do típico estilo americano de se fazer HQs para algo surreal e fantasioso digno das histórias da 2000 A.D. no que tange a personagens de histórias épicas. As histórias passam do clima detetivesco/super-herói para uma distopia/fantasiosa, e ai ela termina deixando a todos nós leitores com gostinho de quero mais.

ISSO AQUI É TOTAL 2000 A.D. !

O álbum traz alguns extras que NÃO são enche-linguiça. Naquele mundo os feitos do Capitão Stone renderam a ele produtos em mídias como histórias em quadrinhos, livros, desenho animado, bustos, camisetas e até filmes. E os extras trazem um pouco disso: Há uma HQ que deu origem a um roteiro de um filme que nunca foi feito, porque o cara sumiu da face da terra e o projeto foi engavetado. Tem uma entrevista do Capitão Stone com a revista Playbunny (Entendeu a referência né?). E também traz extras referentes a própria criação da HQ como capas das edições, desenhos feitos por outros artistas e comentários do autor sobre seu processo criativo que é muito maneiro, faz o leitor leigo em arte entender o quando a arte de Liam Sharp é complicada de se fazer, e é algo que não é copiável, autêntico demais. Tal habilidade com ilustração lhe rendeu até um artbook intitulado “Sharpenings: the Art of Liam Sharp” (Artbook, 2004). Os extras rebuscados também trazem um prefácio de Bill Sienkiewicz, um editorial de Ben Wolstenholme (co-criador da Madefire e amigo pessoal) que fala um pouco da trajetória do Liam e um posfácio de sua esposa Christina McCormack sobre a difícil mudança da Inglaterra para os Estados Unidos e de como fundaram a Madefire, uma empresa de viés artístico, tecnológico voltada para plataformas de mídias digitais.

A trama ainda não teve continuações lá fora. Resta saber qual foi o nível de aceitação dela aqui no Brasil para saber se a Mythos irá dar prosseguimento no futuro com este material bastante original. Acho pouco provável, porque o personagem já é desconhecido, os autores também, e se demorar muito este primeiro volume acaba por cair no esquecimento também. Uma injustiça anunciada. Então, por estas e outras acho pouco provável, mas não impossível que vejamos a sequência deste material. O mercado de alternativos no Estados Unidos está muito aquecido e isso se reflete no Brasil com muitas editoras trazendo esses materiais (vide a publicação quase simultânea de Gideon Falls lá fora e aqui, uma aposta ousada da editora Mino). A Mythos também investe neste mercado e esperamos que continue assim. O preço de capa está acessível, dada a qualidade da história e sobretudo a arte que me pegou pelo experimentalismo.

Aqui vai mais um pouquinho da arte de Liam Sharp.

VERSATILIDADE

Texto por Conde.

Editora Mythos.
192 páginas. Capa Dura, formato americano, papel lwc.
Preço de capa R$ 49,90

mythoseditora titancomics captainstone mascote liamsharp cristinamccormack instahqs instacomics zonanegativa2014 resenharelampago

Curtiu essa resenha? Então siga essa Zona nas redes sociais e não perca nenhum conteúdo! Textos todas as quartas, quintas e sextas.

Minuteman ZN
De vez em quando, um minuteman convidado aparece aqui na Zona Negativa para resenhar um quadrinho, ou para publicar a próxima matéria que irá, por fim, explodir sua cabeça, subverter a realidade e nos levar ao salto quântico para o próximo nível dimensional. Não sabemos exatamente quem são essas pessoas, a não ser que elas abram mão do anonimato e decidam assinar seus verdadeiros (??) nomes ao final do texto. Mas francamente, 'quem' elas são não é o preocupante. Preocupe-se com as palavras delas, que rastejam lentamente para dentro da sua cabeça. Todos são minutemen. Ninguém é minuteman.
O grande irmão está de olho em você. Aprenda a ser invisível.

Deixe um comentário