Ditadura No Ar é ambientada em uma São Paulo noir no final dos anos 60, durante os anos de chumbo e a trama narra a arriscada investigação do fotógrafo Félix Panta para tentar descobrir o paradeiro de sua namorada Lenina, uma estudante comunista levada pelos agentes do DOPS durante uma manifestação. Em dezembro de 1968 o Ato Institucional n°5, conhecido como AI-5, foi o golpe mais duro da ditadura militar. O ano de 1968 que depois ficaria conhecido como “o ano que não acabou”, ficou marcado na história como o nível mais extremo a que chegou o autoritarismo no Brasil e foi o ponto de partida para institucionalizar a repressão política e sepultar as liberdades democráticas. O crescimento dos protestos de movimentos estudantis e greves trabalhistas pelo país foi a desculpa utilizada para a promulgação da AI-5, pois o governo precisava ser mais enérgico no combate a “idéias subversivas”.
De acordo com um dos grandes mestres da narrativa noir em quadrinhos, Ed Brubaker, o que está no coração do que é o noir é a inevitabilidade. Noir é a entropia para a ordem da sociedade, a decadência inevitável de todos nós. O bom noir além de altas reviravoltas nos plots, também é sobre mostrar personagens tão bem construídos que o leitor simplesmente não consegue desviar o olhar enquanto eles passam pelos plots e caem vertiginosamente rumo a essa inevitabilidade. Félix Panta não é o sujeito durão detetivesco que assume a missão de salvar a donzela raptada. Fotógrafo do jornal O Pastiche (referência ao O Pasquim da época), é um sujeito comum e endurecido pela vida, que foi obrigado a deixar suas ideologias de lado para sobreviver a ditadura. Após o misterioso desaparecimento de Lenina, jovem estudante disposta a luta pela reivindicação de direitos e liberdades, Félix decide agir por conta própria e ao avançar nas investigações cai em uma espiral de terror e violência. O roteiro instigante de Raphael Fernandes somado a bela arte de Rafael Vasconcelos, de traço fino e anguloso com um quê de Eduardo Risso, captura e transmite a atmosfera pesada e opressiva, criando uma ambientação perfeita para o leitor emergir na trama. O final é intenso e apesar de sabermos desde o início o quanto Félix está condenado, ainda consegue surpreender.
Vencedora do troféu HQ Mix, Ditadura No Ar foi publicada de forma independente em quatro edições e depois reunida em uma edição encadernada. Uma obra extremamente necessária que nos traz um retrato cru e realista do auge da Ditadura Militar no Brasil e a importância de fazer resistência a toda repressão e discriminação, pois a luta pela garantia de direitos é uma luta sem fim. Resistir é preciso, é proibido proibir.
Editora Draco
104 páginas, R$44,90
