STAR TREK / PLANETA DOS MACACOS – A DIRETRIZ PRIMATA, de Scott Tipton, David Tipton e Rachael Stott, ou “Utopia VS. Distopia”

Inicialmente você pode pensar que o crossover entre Star Trek e Planeta dos Macacos produzido pela editora IDW é mais um daqueles crossovers no mínimo inusitados, que ninguém pediu e de qualidade duvidosa que a editora americana costuma publicar por possuir os direitos licenciados. Confesso que uma série de fatores me fizeram dar uma chance a ele, incluindo minha adoração pela série clássica de Star Trek e o desconto da promoção, claro. Posterguei a leitura e o deixei rolando na pilha. Quando bateu aquela vontade de rever o Capitão Kirk e cia, ao invés de ir direto em um dos episódios da série de tv ou mesmo em um dos filmes, decidi dar uma chance a leitura de Star Trek / Planeta dos Macacos. O trabalho dos irmãos roteiristas Scott e David Tipton em Star Trek – Cidade à beira da eternidade (dei os meus pitacos sobre ela aqui), a última obra dos autores publicada no Brasil, tinha sido satisfatório. Ao ler a sinopse, lembrei de mais uma coisa que havia me chamado a atenção quando a comprei: A trama envolvia um portal transdimensional e universos paralelos, o que remeteu imediatamente a um dos meus episódios favoritos da série clássica chamado “Mirror, Mirror“, onde parte da tripulação é transportada para um sombrio universo paralelo após um defeito no sistema de teletransporte, e trocam de lugar com suas versões daquele universo.

O crossover que você sempre quis ver!
Arquivo X encontra com as Tartarugas Ninja. Vai encarar?

Pode-se dizer que a série clássica de Star Trek e os dois primeiros filmes de Planeta dos Macacos são contemporâneos, mas totalmente opostos em conceito. Então como idealizar o crossover da utopia de Star Trek com a distopia de Planeta dos Macacos, utilizando apenas o recorte cronológico das temporadas da série clássica da tripulação da Enterprise e dos dois primeiros filmes da sociedade símia? Aí que entra o bom trabalho de construção de roteiro dos irmãos Tipton, que mostraram muito conhecimento dos territórios em que estavam pisando, ao escreverem uma trama que pode ser lida sem maiores conhecimentos sobre as duas franquias e que também reúne vários detalhes e referências para os fãs antigos. Os vilões da vez são os klingons, velhos inimigos da Federação dos Planetas Unidos, um povo belicoso e expansionista que extende seus planos de dominação pela galáxia a uma terra paralela onde uma sociedade de macacos inteligentes dominam o mundo, alcançando-a através de um portal transdimensional. Os klingons fornecem tecnologia de ponta para a facção militar do General Marius, com intenção de que seu grupo subjugue os outros e tomem o poder, transformando-os posteriormente em um governo fantoche dos klingons. Anteriormente, a Federação e o Império Klingon haviam firmado um pacto de não agressão elaborado pelos Organianos, uma raça alienígena avançada de seres incorpóreos que interveio contra a guerra entre humanos e klingons. Esse tratado também refreava os impulsos expansionistas do Império Klingon, por isso a busca pela conquista de um universo paralelo. Investigando rumores dessa atividade klingon, a Enterprise descobre o portal e vai até o planeta dos macacos para impedir os klingons e evitar os danos de uma guerra naquela sociedade.

Comandante Kor, o primeiro Klingon que todo fã de Star Trek aprende a amar odiar.

Todo o desenvolvimentos das ações na história, desde a investigação de Kirk e cia, os encontros com personagens importantes de Planeta dos Macacos como o humano forasteiro Coronel Taylor e seus aliados, os primatas cientistas Cornélius e Zira e a humana nativa Nova, são feitos de maneira bem dosada, sem atropelamentos em detrimento da trama principal, visando a construção do relacionamento desses personagens tão estranhos uns aos outros. Os diálogos são bons e a interação entre o elenco de Star Trek realmente passa a impressão de se estar assistindo a um episódio da série de tv. Todos os elementos estão lá, desde as importantes análises de Spock através de seu tricorder, as frases de efeito do ranzinza Dr McCoy, a fanfarronice de Scott, a sagacidade de Sulu e Uhura, as situações na ponte de comando, Checkov garoteando, e a interação entre Kirk e Spock no trabalho de campo, o que sempre rende bons diálogos. E claro, quando rola a porradaria não poderiam faltar um pouco dos movimentos de luta únicos do Capitão Kirk (com direito a uniforme rasgado na pancadaria!), faltando apenas seus famosos flertes, já que todos sabem que o bom e velho Capitão não perdoa ninguém, não importa se for alienígena ou macaco. Na missão, é grande a preocupação de Kirk em não violar a Primeira Diretriz da Federação, que consiste na não interferência no desenvolvimento normal e saudável da vida e da cultura de uma raça alienígena, incluindo a introdução de conhecimentos e tecnologias superiores num mundo onde a sociedade é ainda incapaz de lidar com essas vantagens sabiamente. O debate acerca da violação ou não da Primeira Diretriz no planeta dos macacos é constante, chegando ao ponto de se levantar a questão de se ela seria válida em universos paralelos. O final pode parecer um tanto abrupto, mas levando em consideração que o objetivo era contar uma história do encontro entre os personagens das duas franquias, não havia necessidade de se prolongar em desdobramentos futuros. Para os personagens de Planeta dos Macacos, o fim é a ponte do segundo para o terceiro filme, enquanto para tripulação da Enterprise foi mais uma missão bizarra de terça feira em que os ânimos com os klingons se acirraram, fragilizando ainda mais o tratado Organiano.


Técnicas que certamente te ajudarão a vencer qualquer briga.

Star Trek / Planeta dos Macacos: A Diretriz Primata, foi elaborada através de uma parceria entre a editora IDW e a Boom Studios, editora que detém os direitos de licenciamento de Planeta dos Macacos. A edição nacional ficou por conta da Geektopia, em um bonito encadernado de capa dura compilando as cinco edições da mini série, além de material extra de qualidade, com artigos enumerando algumas referências do roteiro, agregando curiosidades de ambas as franquias e artes de capas alternativas. Pode trazer mais, Dona Geektopia!

A arte é bastante competente e utiliza o rosto dos atores para os personagens.
Bones e Nova só nos olhares. Presta atenção, Charlton Heston!
Rachael Stott, conhecida pelo seu trabalho em Doctor Who para a Titan comics, é a responsável pela arte interna.
Reinaldo Almeida Jr
Reinaldo Almeida Jr, também conhecido como Ray Junior, é narrador de RPG, leitor inveterado e um apaixonado por quadrinhos que anseia fundar seu próprio clube da luta de cultistas a deuses lovecraftianos, viajar pelo multiverso em busca de suas outras versões de terras paralelas para lhes contar que nada é verdadeiro e tudo é permitido, dando início a revolução invisível que nos elevará a quarta dimensão.

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